É possível obter respostas concretas e explicar alguns aspectos surpreendentes e intrigantes da vida de Diane Arbus (14 de março de 1923 – 26 de julho de 1971)? Há 40 anos, Arbus cometeu suicídio por razões que permanecem um mistério. Não li o livro An Emergency in Slow Motion: The Inne of Diane Arbus (Bloomsbury USA, 2011), de William Todd Schultz, professor de psicologia na Pacific University, em Oregon, e autor de uma série de psicobiografias. Schultz dá ele mesmo uma definição de seu trabalho, um perfil da fotógrafa através da análise dos seguintes pontos de referência: a afinidade proscrita, sua sexualidade, segredos, e sua morte. Segundo Schultz, o livro não faz um diagnóstico de Arbus, mas procura discernir os motivos por trás de seus atos e fotografias, em parte, pela recente liberação de vários de seus textos, bem como por entrevistas com o psicoterapeuta da artista. "As fotos de Diane Arbus já eram famosas entre as pessoas que acompanhavam a fotografia quando ela se matou, em 1971; mas, a exemplo de Sylvia Plath, a atenção que sua obra atraiu desde sua morte é de outra ordem – uma espécie de apoteose", escreveu Susan Sontag.
Fotos: © Diane Arbus (Capa / Bloomsbury e Two friends at home, NYC, 1965)
terça-feira, 26 de julho de 2011
quarta-feira, 20 de julho de 2011
Rodrigo Alfaro: morte por parto no Paraguai
Em seu trabalho, o que é mais importante?
Rodrigo Alfaro: Acredito que a maior importância do meu trabalho, excluindo a técnica ou a qualidade da fotografia, diz respeito a como vou enfrentar as situações. Entender o que pensam e sentem as pessoas que fotografo, e saber o que acontece com as fotografias pelas pessoas que as observam.
Sei que dificilmente uma situação injusta de todo um país vá mudar porque realizei um trabalho, não sou tão importante, mas também sei que se alguém vê minhas fotos e se comove por isso, pode ser que sua forma de interpretar essas situações mude, que essa pessoa mude seu modo de atuar e, portanto, que meu trabalho tenha uma pequena incidência de realidade. Ainda que, certamente, o maior potencial do meu trabalho está radicado no futuro, nos que surgirão e deverão se ocupar cada um em seu lugar, para que não permitam que injustiças semelhantes continuem acontecendo.
Meu trabalho é uma pequena parte dentro de muitas vozes que clamam por justiça. Trata-se, também, de fazer o possível para contar histórias caladas ou omitidas pelos grandes meios de comunicação.
Como você alia emoção e razão?
RA: Nesse sentido, tenho um grande professor. James Nachtwey falou de “canalizar emoções através da câmera”, não sei se havia aprendido por completo, mas quando uma situação me supera, consigo me abstrair e falar com a minha câmera. Tudo o que vivi no Paraguai, em cada hospital e em cada bairro diferente, me pareceu comovente e emocionante. Eu senti uma grande responsabilidade porque, em todos os lugares, as pessoas me abriram portas e confiaram em mim para que retratasse o que acontecia com elas. Pensava que deveria fazer um grande trabalho, já que as pessoas em situações tão complicadas me aceitavam. Fiz um grande esforço emocional para conseguir juntar meus sentimentos com um modo de mostrar os acontecimentos em imagens.
Qual foi o momento mais difícil?
RA: O princípio. Depois de um mês, passando 15 horas por dia lendo e vivendo notícias relacionadas com a saúde de mães e filhos no Paraguai, cheguei em Assunção numa segunda-feira, às 9h da manhã, e às 11h estava vestido de cirurgião, assistindo a desnecessária morte de um bebê, e vendo como mandavam sua mãe a outro hospital, sem chances de salvar sua vida. Eu sabia de antemão o que iria enfrentar, mas tudo aquilo me pareceu ridículo, pessoas morrendo pela falta de exames simples ou, nesse caso, por não tomarem remédios corriqueiros e de baixo custo para a pressão. Durante a semana, entendi que aquilo tudo me afetaria. De qualquer maneira, eu só tinha 23 anos e uma câmera fotográfica, e me lembrei da história de “canalizar as emoções através da câmera”. Comecei a sentir que aquilo funcionava bem, e quando colocado em prática, encontrava rapidamente um modo de evitar qualquer obstáculo. Estava certo de que meu trabalho ali causaria algo de bom, senti confiança e responsabilidade, e estou satisfeito com o resultado.
Tudo ia bem até eu adoecer no Hospital de Boquerón, e terminar numa das camas que fotografei (foto 7 da reportagem completa). Esse foi outro momento ruim. Eu pensava em continuar o trabalho pela Bolívia, e planejava chegar logo ao Peru, mas de repente me vi encalhado nesse lugar, numa situação similar a das pessoas que havia fotografado dias antes, sem saber o que eu tinha. Depois de três dias, uma ambulância surgiu, me levaram até Assunção e lá quiseram me internar numa clínica. Fugi do hospital ao aeroporto e voltei para a Argentina.
A reportagem foi amplamente divulgada, um reconhecimento e referência legítima de uma denúncia. Como foi essa experiência?
RA: Um mês e meio depois, estava recuperado, pensava que meu trabalho não era bom, que estava incompleto. Eu o imaginara como parte de algo muito maior, e ver o que havia fotografado não me satisfazia. Também tentei publicar o trabalho, para que não caísse no esquecimento, mas os 40 veículos que contatei não respondiam meus emails nem telefonemas. Levei vários meses até conseguir a primeira publicação - depois de ser um dos ganhadores da bolsa de estudos Ian Parry – e justamente no Spectrum, do The Sunday Times. Daí em diante surgiram muitas publicações importantes, prêmios e exposições que me deram grande satisfação em saber que tudo o que enfrentei no Paraguai não foi em vão, e essas histórias foram contadas.
Acho que o maior ensinamento é que se você tem algo bom para mostrar, é inevitável que as fotos acharão seu caminho e chegarão onde devem chegar.
Fotos: © Rodrigo Alfaro
(Tradução Antônio Tibau)
Fotografias gentilmente cedidas. Todos os direitos reservados a Rodrigo Alfaro.
segunda-feira, 18 de julho de 2011
Umberto Eco: Uma foto
Um ensaio de Umberto Eco tem seu foco na imagem de um indivíduo, a figura central, isolada, durante uma manifestação contra a repressão, em Milão, em 14 de maio de 1977. A fotografia foi publicada em todos os jornais italianos, após ter sido estampada pelo Corriere d’Informazione, e a imagem torna-se ícone, a referência à revolta dos "anos de chumbo". Eco interpreta as respostas reais às imagens, lembrando que uma explicação sozinha nunca é suficiente para explicar tudo: "O fato é que apareceu uma foto."
"Se for lícito (mas é cabível) fazer observações estéticas num caso desses, essa é uma das fotografias que passarão à história e que irão aparecer em mil livros. As vicissitudes de nosso século são resumidas por poucas fotos exemplares que marcaram sua época: a multidão desordenada que se derrama na praça durante "os dez dias que abalaram o mundo", o miliciano morto por Robert Capa; os marines que fincam a bandeira numa ilhota do Pacífico; o prisioneiro vietnamita justiçado com um tiro na têmpora; Che Guevara arrebentado, esticado na mesa de uma caserna. Cada uma dessas imagens tornou-se mito e condensou em si uma série de discursos. Superou a circunstância individual que a produziu, deixou de falar daquele ou daqueles personagens isolados, mas passou a exprimir conceitos. (...) Aquela foto não se parecia com nenhuma das imagens em que se havia inspirado, ao menos durante quatro gerações, a idéia de revolução. Faltava o elemento coletivo, aparecia de modo traumático a figura do herói individual. E esse herói individual não era o da iconografia revolucionária. (...) A foto, para uma civilização já agora habituada a pensar por imagens, não era a descrição de um caso isolado (e, de fato, não interessa saber quem era a personagem, nem a foto permite identificá-la), era um raciocínio. E funcionou. (...) A partir do momento em que surgiu, seu trajeto comunicativo começou: e uma vez mais o político e o privado foram atravessados pelas tramas do simbólico que, conforme sempre aconteceu, demonstrou-se produtor da realidade." (L’Espresso, 29 de maio de 1977).
Como previu Umberto Eco, a foto resultou num livro (Storia di una foto, por Sergio Bianchi, 2011) e, com certeza, será reproduzida em 999 blogs.
(Umberto Eco, Viagem na realidade cotidiana; tradução Aurora Fornoni Bernardini e Homero Freitas de Andrade. - Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984, p. 269).
Foto: autor desconhecido / Corriere d'Informazione (Milão, 14 de maio de 1977)
"Se for lícito (mas é cabível) fazer observações estéticas num caso desses, essa é uma das fotografias que passarão à história e que irão aparecer em mil livros. As vicissitudes de nosso século são resumidas por poucas fotos exemplares que marcaram sua época: a multidão desordenada que se derrama na praça durante "os dez dias que abalaram o mundo", o miliciano morto por Robert Capa; os marines que fincam a bandeira numa ilhota do Pacífico; o prisioneiro vietnamita justiçado com um tiro na têmpora; Che Guevara arrebentado, esticado na mesa de uma caserna. Cada uma dessas imagens tornou-se mito e condensou em si uma série de discursos. Superou a circunstância individual que a produziu, deixou de falar daquele ou daqueles personagens isolados, mas passou a exprimir conceitos. (...) Aquela foto não se parecia com nenhuma das imagens em que se havia inspirado, ao menos durante quatro gerações, a idéia de revolução. Faltava o elemento coletivo, aparecia de modo traumático a figura do herói individual. E esse herói individual não era o da iconografia revolucionária. (...) A foto, para uma civilização já agora habituada a pensar por imagens, não era a descrição de um caso isolado (e, de fato, não interessa saber quem era a personagem, nem a foto permite identificá-la), era um raciocínio. E funcionou. (...) A partir do momento em que surgiu, seu trajeto comunicativo começou: e uma vez mais o político e o privado foram atravessados pelas tramas do simbólico que, conforme sempre aconteceu, demonstrou-se produtor da realidade." (L’Espresso, 29 de maio de 1977).
Como previu Umberto Eco, a foto resultou num livro (Storia di una foto, por Sergio Bianchi, 2011) e, com certeza, será reproduzida em 999 blogs.
(Umberto Eco, Viagem na realidade cotidiana; tradução Aurora Fornoni Bernardini e Homero Freitas de Andrade. - Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984, p. 269).
Foto: autor desconhecido / Corriere d'Informazione (Milão, 14 de maio de 1977)
domingo, 17 de julho de 2011
Lutz Dille
Na década de 1950, o fotógrafo alemão Lutz Dille (1922-2008) rejeitou os paradigmas da fotografia praticada então, e buscou uma imagem simples e mais realista pelas ruas de Paris. Dille emigrou para o Canadá, em 1952, produzindo documentários em curta-metragem para a rede de televisão CBC - Canadian Broadcasting Corporation, em Toronto. Na sequência, Dille deu início à carreira, sua escolha não tem um conceito subjetivo, não, ao menos, no sentido estético, mas simplesmente registrar pessoas nas ruas. Por meio destes projetos, ele fotografou e filmou por toda a Europa, Estados Unidos e México. Em 1975 e novamente em 1977, Dille visitou Salford, uma cidade industrial no Norte da Inglaterra, onde bairros inteiros estavam sendo demolidos; essa foi a única vez que ele fotografou em cores. Entre 1993 e 1995, a FNAC Photo Galeries de Paris, organizou a exposição retrospectiva Lutz Dille, Street Photography 1951-1968.
Na definição de Alan Porter, editor da revista suíça Camera, o fotógrafo itinerante geralmente se identifica, em grande parte, com as pessoas e lugares que ele descobre, e normalmente tenta ser o mais objetivo possível em relação ao seu tema, e uma coisa é certa: ele não gosta de ser chamado de jornalista.
Fotos: © Lutz Dille (Wodbine racetrack, 1956 / Stephen Bulger Gallery e Londres, 1961/ Museum of London)
Arnold Crane
Durante mais de duas décadas, o norte-americano Arnold Crane produziu um substancial corpo de trabalho fotografando os grandes mestres da fotografia, André Kertész, Brassai, Imogen Cunningham, Ansel Adams, Bill Brandt e muitos outros. Edward Steichen, então diretor do departamento de fotografia do MoMA, sugeriu a publicação de um livro depois de ver suas fotos de Man Ray. Em 1995, uma seleção desses retratos é publicada no livro, "On the Other Side of the Camera" (Könemann Köln), nessa data, recebe da Kodak o prêmio Photobook. Com o apoio e o encorajamento de uma geração de fotógrafos, Crane aceitou de imediato a ideia do livro porque queria mostrar quem são realmente essas pessoas em suas fotos. Em entrevistas, Crane contou que não conseguiu fazer os retratos de Margaret Bourke-White, a fotógrafa tinha a doença de Parkinson e sua enfermeira não autorizou a sessão, e de Richard Avedon, seu secretário particular o impediu de chegar perto dele.
No que se refere a ele, Arnold Crane odeia ser fotografado.
Fotos: © Arnold Crane (Man Ray com sua lente "Verre Laurent" em seu estúdio em Paris, 1969-1974 e Paul Strand, 1968)
No que se refere a ele, Arnold Crane odeia ser fotografado.
Fotos: © Arnold Crane (Man Ray com sua lente "Verre Laurent" em seu estúdio em Paris, 1969-1974 e Paul Strand, 1968)
quinta-feira, 14 de julho de 2011
Horrores da guerra
Volto ao livro "Uma história da leitura", de Alberto Manguel. Na sequência dos textos, reprodução de duas fotografias emblemáticas. Em 10 de maio de 1933, em Berlim, diante das câmeras, o ministro de propaganda do regime nazista Joseph Goebbels discursou durante a queima de mais de 20 mil livros para uma multidão entusiasmada de cerca de 100 mil pessoas. "Uma fotografia tirada em 1940, durante o bombardeio de Londres na Segunda Guerra Mundial, mostra os restos de uma biblioteca desmoronada. Pelo teto destruído veem-se prédios fantasmagóricos do lado de fora, e, no centro da peça, há uma pilha de vigas e móveis em pedaços. Mas as estantes na parede ficaram firmes e os livros parecem inteiros. Três homens encontram-se no meio dos destroços: um, como se hesitasse sobre qual livro escolher, está aparentemente lendo os títulos nas lombadas; outro, de óculos, está pegando um volume; o terceiro está lendo, segurando um livro aberto nas mãos. Eles não estão dando as costas para a guerra, nem ignorando a destruição. Não estão escolhendo livros em vez da vida lá fora. Estão tentando persistir contra as adversidades óbvias; estão afirmando um direito comum de perguntar; estão tentado encontrar uma vez mais - entre as ruínas, no reconhecimento surpreendente que a leitura às vezes concede - uma compreensão."
(Alberto Manguel, Uma história da leitura; tradução Pedro Maia Soares. - São Paulo: Companhia das Letras, 1997)
Fotos: © Hulton-Deutsch Collections/ Corbis (Nazistas queimam livros, Berlim, 10 de maio de 1933 / leitores na biblioteca da Holland House, Londres, 1940)
domingo, 3 de julho de 2011
Linha do tempo: 1971
Fatos que ocorreram em 1971: Fundada a organização humanitária Médicos sem Fronteiras. Guerra civil no Paquistão. Proclamada a República de Bangladesh, epidemia de cólera no país. Morre o compositor Igor Stravinsky. O Congo passou a se chamar Zaire. Sequestro e desaparecimento do deputado Rubens Paiva pela ditadura militar, no Rio de Janeiro. NASA lança missão Apollo 15. Independência do Qatar. Invenção do microprocessador. Morre o trompetista norte-americano Louis Armstrong. Assinado tratado de amizade entre India e União Soviética. Entrada da China Popular na ONU. Passeata contra a guerra do Vietnã, em Washington D.C.. Independência dos Emirados Árabes. Chico Buarque compõe a canção Construção. Para driblar a censura, Chico inventou o personagem Julinho da Adelaide para que censores aprovassem distraidamente as músicas deste compositor que não conheciam. Em Uganda, Idi Amin Dada lidera golpe de Estado e assume o poder. Na França, a revista Le Nouvel Observateur publica o Manifesto 343, em favor do aborto e pela difusão dos métodos contraceptivos. Morte de Jim Morrison, integrante do grupo The Doors. Lançamento do álbum dos Rolling Stones Sticky Fingers, com capa de Andy Warhol. Leonard Freed fotografa durante protesto em Londonderry, no confronto entre exército britânico e militantes do IRA, centenas de casas foram incendiadas. O ex-capitão Carlos Lamarca, líder do grupo guerrilheiro MR8, é morto pelo exército na Bahia. O cineasta Glauber Rocha apresenta o Manifesto Estética do Sonho, na Universidade Columbia, em Nova York: "O sonho é o único direito que não se pode proibir."
(Chico Buarque, o tempo e o artista. Regina Zappa, Biblioteca Nacional, Rio de Janeiro, 2004)
Fotos: © Alécio de Andrade (Glauber Rocha, Paris, 1971 / Acervo IMS e © Leonard Freed / Magnum Photos (Mulheres católicas protestam em Londonderry, Irlanda do Norte, 1971)
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