(...)" Pois era precisamente esse corpo que ele detestava com mais paixão: a augusta silhueta de senador romano, que dava a impressão de enredar-se nas dobras da sua toga, o belo rosto reflexivo, que unia os bons modos de Sócrates à sabedoria de Buda, não passavam eles, aos seus olhos, de uma mistura facilmente identificável de languidez incurável de temperamento com empazinamento precoce de bon vivant. Seu espelho apenas lhe devolvia falta de energia, queixo duplo e covardia. E ele tinha horror, sem sombra de dúvida, de todas as fotografias que o expunham na imprensa aos olhos do mundo. Mas, excluindo as imagens que o representavam no papel de escritor, ele experimentava pelo contrário fortes emoções positivas (empáticas, fascinadas) diante dos vestígios do passado, até mesmo bastante recentes, deixados pelos fotógrafos de preferência amadores. Não é difícil explicar essa aparente contradição: a foto pertence ao domínio da morte, morte dos amigos, dos pais desaparecidos ou de vidas anônimas de outros e antigos tempos; morte das coisas da vida, morte do instante que passava despreocupadamente e que o clic da máquina fotográfica matou. Roland Barthes não tinha estômago para contemplar-se morto (...)." Alain Robbe-Grilet (Roland Barthes artista amador, CCBB, 1995).
Foto: © Jerry Bauer (Roland Barthes, 1970)
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